Caminhoneiros têm alto risco para doenças cardiovasculares
Estima-se que existam no Brasil cerca de 2 milhões de caminhoneiros, população conhecida por enfrentar uma rotina extenuante de trabalho, de até 16 horas por dia. Os profissionais ainda têm que lidar com o problema da má conservação das estradas e com a violência, o que gera uma alta carga de estresse no dia a dia.
Uma pesquisa liderada pela médica Carine Sangaleti mostrou que a categoria apresenta uma série de fatores de risco para problemas cardiovasculares. O estudo está vinculado à Universidade Estadual do Centro-Oeste (Unicentro) e ao InCor e também foi publicado na revista britânica BMC Public Health.
Na pesquisa, chamou atenção o fato de que 73% dos 250 caminhoneiros entrevistados eram sedentários. Outro número alarmante é o de consumo de bebida alcoólica: 66% dos participantes. O tabagismo faz parte da rotina de 30% dos motoristas de caminhão entrevistados e foi avaliado que 45% têm hipertensão, fatores de risco importantes para a saúde do coração. O sobrepeso atinge 79% dos profissionais entrevistados.
O estudo identificou também que 20% dos participantes usavam algum tipo de substância estimulante e 16% deles apresentavam alterações nos níveis de glicose e insulina, sendo que 13% dos que tinham a glicose aumentada também mostravam uma circunferência abdominal maior, com mais de 102 cm. Pesquisas indicam que há uma associação significante da gordura abdominal com riscos cardíacos.
Segundo o cardiologista Roberto Kalil Filho, diretor do InCor, as pessoas sedentárias, hipertensas, obesas, fumantes e com colesterol alto correm maior risco de desenvolver doenças coronarianas.
Outros fatores como o uso de bebidas alcoólicas e substâncias estimulantes também contribuem para a maior incidência de doenças no coração.
“Essa é uma frente de ação muito inovadora na cardiologia. Ninguém consegue estudar os caminhoneiros e eles têm um alto risco para doença cardiovascular. Infelizmente, é uma população não assistida por nenhum serviço de saúde e que pode ter problemas cardíacos e outros enquanto trabalham”, diz Carine.
O cardiologista Luiz Bortolotto, diretor da Unidade de Hipertensão do InCor e professor da USP, comentou a pesquisa.
“Serve como alerta de que tem uma população de alto risco para ocorrência de doenças cardiovasculares, ainda mais que os outros riscos estão associados ao uso de estimulantes.”
Bortolotto ainda apontou algumas possíveis soluções para a questão envolvendo os caminhoneiros.
“Tem que ser feito um trabalho educacional, de orientação dessa população, para que eles tenham mais cuidado. Além desse trabalho, talvez um sistema de apoio, de avaliação médica. Quem sabe um tipo de atendimento em estrada, unidades [móveis] de saúde dedicadas a esse tipo de população.”
Falta de segurança e demora
Para o presidente da Federação dos Caminhoneiros Autônomos de São Paulo, Claudinei Pelegrini, o atendimento médico nas estradas não é o principal problema, pois os caminhoneiros até contam com algumas ações em prol da saúde da categoria.
“Passamos por situações de estresse com a falta de segurança nas rodovias e a demora para carga e descarga. Tem gente que espera dias numa fila dentro de um caminhão enquanto as contas vão vencendo”, aponta Pelegrini.
Além disso, afirma, o motorista carrega excesso de carga, o que acaba aumentando o tempo de deslocamento por causa do peso do caminhão.
Segundo o representante dos caminhoneiros, essas questões fazem com que o profissional não tenha tempo disponível para frequentar os postos de atendimento médico e odontológico existentes nas estradas. “Infelizmente a rotina de alguns não permite.”
Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo