Já fez o “RG” do coração dos seus filhos?
Contra números não se pode ter mais argumentos – e esses são números preocupantes: a cada ano, cerca de 140 mil pessoas morrem no Brasil por causa de doenças no coração. Os dados da OMS (Organização Mundial da Saúde) mostram, assim, que olhar mais de perto para esse órgão se torna cada vez mais necessário. E o hábito deveria começar o quanto antes.
Cerca de 90% dessas mortes, inclusive as decorrentes de mal súbito, poderiam ser evitadas com o diagnóstico de um simples eletrocardiograma seguido de tratamento e acompanhamento médico. O doutor Carlos Alberto Pastore, diretor da Unidade Clínica de Eletrocardiologia de Repouso do Instituto do Coração (InCor) do Hospital das Clínicas da FMUSP, vai ainda mais longe: crianças deveriam ter seus coraçõezinhos monitorados.
Os pequenos que vão iniciar prática esportiva ou que possuem histórico de doença cardiovascular na família são os que mais precisam desse “RG” do coração – uma forma de saber como se comporta o organismo daquela criança e não esperar que um possível problema apareça para então ser tratado.
“Hoje em dia, a garotada de 12, 14 anos já começa a participar da prática esportiva competitivamente. Por isso, é importante ter um entendimento de como está o coração dessa criança – será como um documento que ele poderá apresentar como partida para outros exames no futuro”, explica Pastore.
A necessidade do exame aumenta ainda mais caso exista histórico de doença cardíaca na família – especialmente se pais ou avós tiverem passado por problemas antes mesmo da terceira idade, em torno dos 40 ou 50 anos, um indicativo grave de risco.
Segundo o cardiologista, uma consulta completa e um eletrocardiograma bem interpretado – que, diga-se, é um exame que não leva mais de 5 minutos – podem diagnosticar praticamente qualquer problema cardíaco, principalmente os congênitos. Quanto antes as doenças são diagnosticadas, maiores as chances de sucesso no tratamento e de que a criança e o adolescente tenham vida normal quando chegarem à fase adulta.
“A exigência de eletrocardiograma em clubes e academias varia conforme os países – os Estados Unidos, por exemplo, não pedem, assim como no Brasil, mas muitos países europeus sim. Um indicativo de porquê acontecem mais mortes por mal súbito nos Estados Unidos”, lembra o médico.
“É um erro esses locais não exigirem avaliação cardiológica. Mas mesmo que isso não seja solicitado, os pais devem estar atentos e devem manter os pediatras de seus filhos informados sobre o início da vida esportiva para avaliação da conveniência de realizar exames preventivos”, diz Pastore.
O ponto alto dessa prevenção está mesmo no eletrocardiograma, exame que registra a atividade elétrica do coração. É ele que mostra quadros alterados de aparecimento ou evolução da maioria das doenças cardíacas – principalmente as arritmias, sejam em pessoas doentes ou saudáveis.
O eletrocardiograma vem mudando com o crescimento da tecnologia nessa área e os estudos sobre genética. Com as evoluções do método de diagnóstico, foram surgindo diversas variantes do exame que, na forma original, é feito com o paciente deitado e em repouso. Surgindo qualquer alteração no eletro mais simples, o cardiologista pode requisitar exames de outros tipos, como ecocardiograma ou uso do holter.
Se a criança é avaliada e nenhuma alteração é registrada, só é preciso passar novamente por exames depois dos 30 anos, quando é hora de começar novas baterias de avaliações cardiológicas preventivas para adultos. E o “RG do coração” será, nesse momento, um ótimo ponto de partida.
Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo