Déficit de Atenção: saiba mais sobre diagnóstico e tratamento
O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tem base genética e acomete cerca de 5% da população infantil mundial, sendo o mais comum de início na infância.
Segundo dados da Associação Brasileira de Déficit de Atenção (ABDA), cerca de 3% a 5% das crianças brasileiras sofrem desse transtorno, sendo a prevalência maior em meninos do que em meninas. O diagnóstico é geralmente feito durante o Ensino Fundamental.
A quantidade de informações que temos acesso diariamente tem se tornado cada dia mais difícil de administrar. Toda essa informação é processada no nosso cérebro. Ele é responsável por analisar as informações que obtemos do mundo a partir dos nossos sentidos e apresentar uma resposta adequada a determinadas situações, de acordo com o contexto cultural e social.
Existem áreas e circuitos cerebrais específicos para cada função: atenção, controle do impulso, memória operacional, planejamento e organização da execução das tarefas. Por meio do neurodesenvolvimento, a criança vai aprendendo a controlar sua atenção, inibir alguns impulsos e a regular suas próprias emoções.
É por conta desse esforço que conseguimos manter o estímulo frente a uma tarefa entediante e finalizar grandes desafios em longo prazo. Para isso, a criança precisa conseguir regular suas emoções, planejando as ações antes de tomar uma decisão complexa e ponderando o que é mais apropriado à determinada situação.
Diagnóstico
Um dos critérios diagnósticos segundo o Manual Estatístico de Transtornos Mentais DSM-V é que o transtorno esteja presente desde antes dos 12 anos de idade, época em que a criança passa a ter mais maturidade e começa a ter capacidades maiores de controle em determinadas situações.
Os sintomas devem interferir significativamente, trazendo prejuízos funcionais em diversas áreas da vida como na escola, nas atividades extracurriculares e nas relações de amizade e com a família. Cerca de 60% a 85% as crianças com TDAH na infância permanecem com os sintomas do transtorno na adolescência e na vida adulta.
Apesar dos indícios de alterações das estruturas cerebrais em pesquisas, o diagnóstico atualmente ainda continua sendo clínico, realizado por especialistas na área em avaliações multidisciplinares. Geralmente é investigada a capacidade de compreensão de limites, dinâmica familiar e escolar, estilo de vida, principais queixas e dificuldades.
Considerando todas as avaliações, quem fecha o diagnóstico e está apto a prescrever medicamentos para amenizar os sintomas, caso haja necessidade, são principalmente os neurologistas e os psiquiatras.
Como é o cérebro de uma criança com TDAH?
Recentemente, no maior estudo multicêntrico já conduzido (Hoogman et al., 2017), cientistas observaram certo atraso no desenvolvimento do cérebro dos pacientes com TDAH. Neste estudo, mais de três mil participantes, divididos em grupos de pacientes com TDAH e indivíduos saudáveis, entre quatro e 64 anos, foram submetidos a exames de ressonância magnética a fim de estudar precisamente as estruturas cerebrais.
Os resultados revelaram que algumas estruturas cerebrais como a amígdala cerebral e o hipocampo são menores nos pacientes com TDAH. Essas estruturas cerebrais são responsáveis pela regulação das emoções, da motivação e do chamado sistema de recompensa, que modifica nosso comportamento através da sensação de prazer.
Em análise por faixa etária, foi observado que estas alterações são mais leves nos pacientes adultos, o que sugere que exista uma compensação ao menos parcial com o passar dos anos.
O estudo é considerado uma das maiores evidências até hoje de que o TDAH é um transtorno relacionado ao atraso na maturação de regiões cerebrais reguladoras das emoções, pois essas estruturas estão menos desenvolvidas, principalmente nas crianças.
Quais os prejuízos funcionais no dia a dia?
As crianças com TDAH podem ter dificuldades em três grandes áreas cognitivas: na atenção, no monitoramento motor (hiperatividade) e no controle inibitório (impulsividade).
Na esfera da atenção, distraem-se com barulhos ou coisas do ambiente, às vezes não escutam o que o outro está falando, sendo necessário repetir a informação e podem não se atentar a detalhes das tarefas como errar uma conta porque não percebem o sinal da operação matemática, esquecer o que têm para fazer de lição de casa ou alguma informação que foi conversada no dia.
Na esfera da hiperatividade, têm dificuldades para controlar as funções motoras, buscando qualquer motivo para se levantar, andar, correr e pular, apenas para se movimentar. Costumam realizar as tarefas de forma rápida, apenas para se livrar delas, e sem esperar as instruções até o fim.
Na esfera do controle executivo, têm dificuldades em regular suas emoções e inibir vontades na espera de um reforço maior em longo prazo. Conteúdos com muita informação se tornam muito difíceis, então tendem a evitar tarefas consideradas desinteressantes ou que exigem muito esforço mental para se concentrar e se manter na tarefa.
Na sociedade, as crianças com TDAH podem apresentar baixo rendimento escolar e ter comportamentos de risco. Além disso, se deparam constantemente com sentimento de inadequação e fracasso, devido às frequentes frustrações de não conseguir realizar o que desejam e não conseguir manejar seu próprio comportamento, refletindo intensas dificuldades no relacionamento entre pares e nas interações familiares.
Por que algumas crianças têm mais dificuldade do que outras?
Algumas crianças podem apresentar falhas na entrada da informação, ou seja, na capacidade de manter a atenção, de inibir os fatores de distração ou de controlar os impulsos. Essas falhas acabam desencadeando problemas no desempenho escolar, na aprendizagem em geral e nas relações sociais. Quando essas falhas são específicas, persistentes e afetam a vida do indivíduo de forma significativa, podemos considerar a presença do TDAH.
Tratamento
O diagnóstico não serve como um rótulo, mas como uma identificação da condição do funcionamento cognitivo, a fim de nortear a conduta do tratamento.
As medicações se utilizam de mecanismos químicos para amenizar os sintomas, mas há também indicação de acompanhamento terapêutico multidisciplinar nas áreas de dificuldade: pedagógico, fonoaudiólogo, psicoterapia e reabilitação neuropsicológica.
Além disso, é importante contemplar orientações sobre o próprio funcionamento do paciente aos pais e à escola para entenderem suas diferenças e potencialidades, direcionando formas de enfrentamento. Com o tratamento correto, as crianças podem potencializar seus interesses e encontrar o seu lugar no mundo, diminuindo os estigmas e aproveitando ao máximo suas capacidades e individualidade.
*Diretora da clínica Plenamente, Maria Alice Fontes é formada em psicologia pela PUC-SP, doutora em saúde mental pelo Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina (Unifesp) e mestre em ciências pelo Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina. Também é especialista em Terapia Cognitiva pelo Beck Institute of Cogntive Therapy (Philadelphia, EUA).
* Daniela Antônio é mestre em Distúrbios do Desenvolvimento e tem especialização em Neuropsicologia pelo Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – IPq HCFMUSP, além de membro da equipe da clínica Plenamente.