Após o eclipse total do sol, ficam suas influências
Para psicólogos e especialistas em saúde da mente, um eclipse não é apenas o alinhamento dos astros que causa um efeito de luz curioso e comemorado por gente com óculos especiais.
Há anos estudos são publicados relacionando os eclipses lunares e solares (como o que aconteceu nesta segunda-feira e foi registrado com 100% de visibilidade em algumas regiões dos Estados Unidos) a mudanças comportamentais.
E há uma outra percepção: o eclipse solar ocorrido neste 21 de agosto, o mais importante desde 1927, “não tem impacto físico no corpo humano que possa explicar efeitos como a ansiedade”. É isso o que diz a NASA, agência espacial norte-americana.
A ciência astronômica, em geral, rebate que haja qualquer impacto relevante do eclipse solar nos seres humanos – ou que isso é puramente psicológico. Aí está, justamente, a questão.
Um eclipse solar ocorre quando a lua passa entre a terra e o sol de tal forma que bloqueia, por alguns momentos, a vista e a luz do astro-rei. Um eclipse solar completo geralmente só dura cerca de dois minutos. Mas, antes que o estudo da ciência existisse para explicar o fenômeno, isso costumava assustar bastante as pessoas: ver o sol escurecer no meio do dia “sem motivo”, segundo historiadores, aterrorizava as comunidades primitivas milhares de anos atrás.
O caso é que, apesar do conhecimento moderno, o eclipse solar ainda causa sensações como euforia e ansiedade em muitas pessoas. Mesmo que todos saibam que são apenas os corpos celestes fazendo suas trajetórias regulares, um eclipse ainda se mostra capaz de mexer com os seres vivos.
Um dos primeiros estudos a lidar com a questão aconteceu em 1981 e foi veiculado por uma publicação científica da Índia. A pesquisa sugeriu que um eclipse solar pode causar ansiedade e influenciar temporariamente os níveis do hormônio prolactina em algumas pessoas (presente em homens e mulheres, o hormônio tem, por exemplo, a função de “avisar” ao corpo sobre a produção de leite nas glândulas mamárias).
Mais recentemente, um grupo de psicólogos ligados à Universidade de Viena publicou um estudo relacionando os eclipses (observando registros colhidos durante um evento específico ocorrido em 1999) a um aumento na ocorrência de suicídios.
Martin Voracek, Maryanne Fisher e Gernot Sonneck concluíram que, para algumas pessoas, o alinhamento dos astros representa um momento de extrema ansiedade e uma obsessão – e que, se para muitos é um evento excitante de modo positivo, outros veem como um episódio espiritual, quase religioso, e não suportam a pressão.
O “estresse do eclipse solar” é experimentado por alguns, enquanto outros sentem o fenômeno astrológico apenas como algo interessante. Os cientistas acreditam que essa diferença de posicionamento ser explicado por uma série de fatores – incluindo temperamento, a crença pessoal, experiências passadas ou mesmo a influência do tipo de canal de informação que as pessoas consultam.
Não está claro, para a ciência de modo geral, se a ansiedade do eclipse solar poderia ter uma causa fisiológica, mas a linha mais forte é de que ele tem mais implicações para aqueles com maior inclinação espiritual.
Durante o eclipse desse 21 de agosto, muita gente com interesses ligados à astrologia (mais do que à astronomia) se posicionaram como crentes de que o fenômeno seria como um “botão de reinicialização” – de que o evento poderia levar à maior consciência, união entre as pessoas e renovação de fase.
Há ainda quem misture a ciência com a espiritualidade e relacione os sentimentos sobre o eclipse com uma alteração da gravidade e com os campos eletromagnéticos que influem sobre a Terra e os seres humanos. Cientistas (como a própria NASA se pronunciou) tendem a ver isso como impossível, já que as mudanças são ínfimas.
Mesmo que evidências de um lado e de outro ainda demandem mais pesquisas, é certo que os eclipses vêm provocando reações nos seres vivos desde o início da civilização. E talvez encarar como um evento físico, mas também como uma oportunidade para refletir sobre mudanças de atitude e de nossa influência no mundo, mais até do que a influência dos astros sobre nós, seja mesmo uma boa ideia.
Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo