Cãibra: surpresa indesejada
Quem acompanha uma partida de futebol pela televisão certamente já se deparou com a cena. O jogador cai no gramado com uma expressão de dor, estica a perna e grita pela ajuda de quem estiver mais perto, seja seu companheiro de time, seja o próprio adversário. A cãibra aparece de forma sorrateira e ainda que não seja fatal gera bastante desconforto e dor para quem a sente.
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Não é necessário ser atleta profissional para senti-la, no entanto. Qualquer pessoa está sujeita a episódios deste tipo, a depender de sua condição física e alimentar. Conhecer suas causas e o que se deve fazer no momento da cãibra é, portanto, informações úteis para todos que desejam evitar (ou minimizar) ocorrências deste tipo.
Na maioria das vezes, a cãibra é associada a um episódio comum e corriqueiro da vida das pessoas. Isso não significa, no entanto, que ela não pode ser minimizada. A ocorrência exagerada de cãibras – especialmente em períodos específicos, como quando a pessoa está dormindo – gera enorme desconforto, inclusive porque, em boa parte dos casos, o indivíduo tem dificuldade para resolver a situação sozinho, necessitando da intervenção de uma outra pessoa.
De acordo com Maurício Daniel Gattaz, médico clínico do Hospital Sírio-Libanês, ainda que a cãibra dure apenas poucos minutos, a dor que aparece após o desconforto inicial pode ser desde moderada até bastante intensa. O especialista aponta que é possível definir a cãibra como uma contratura de alguns grupos musculares que ocorre de maneira involuntária.
“Os grupos musculares mais frequentemente comprometidos são da panturrilha – batata da perna -, coxa e pés, mas também pode ocorrer em qualquer outro grupo muscular”, explica Gattaz.
Mas, afinal, o que causa as cãibras? De acordo com o médico, as causas mais frequentes de dores deste tipo estão relacionadas a alterações de eletrólitos em nosso corpo. Eletrólitos são definidos como soluções que garantem a passagem de elétrons, que trafegam juntamente aos íons. Na prática, esse tipo de situação é observado quando a pessoa apresenta baixa de sódio, cálcio, magnésio e/ou potássio.
Gattaz revela que as causas para esse desequilíbrio são variadas. Alguns diuréticos podem levar à queda do potássio, outros de sódio. Além disso, algumas drogas para tratamento de colesterol (estatinas) podem resultar em dores musculares e cãibras, assim como doenças endocrinológicas da tireoide ou paratireoide.
No entanto, uma das situações mais comuns atreladas às cãibras reside justamente nos casos de atletas que fazem exercícios e não mantêm uma hidratação adequada. Esse é um dos motivos de verificarmos com frequência ocorrências desse tipo entre jogadores de futebol, por exemplo. Os atletas – ainda que bem preparados e treinados – são comumente expostos a um esforço extremo, geralmente em períodos de forte desgaste físico (às 16h, em meio à forte incidência do sol, por exemplo).
“Na transpiração, perdemos água e sal. Se a reposição de líquidos não for bem balanceada [por exemplo, somente com água], gera cãibras por queda do sódio”, explica o especialista.
Uma das principais recomendações do médico para os que praticam esporte, ainda que de forma amadora, é o uso de soluções isotônicas. O mercado oferece uma vasta gama de opções para atletas profissionais e amadores que desejam complementar e qualificar a hidratação durante as atividades físicas.
Desafios e recomendações
A cãibra, no entanto, não ataca apenas quem pratica atividades físicas. Ela pode ser uma das manifestações de determinadas doenças neurológicas, geralmente acompanhadas de outros sintomas. “Pacientes com insuficiência renal, cardíaca e hepática podem ter cãibras por múltiplos fatores associados”, explica Gattaz.
Ainda assim, um dos principais desafios clínicos no que diz respeito às cãibras atualmente está ligado às que ocorrem no período noturno, enquanto as pessoas estão dormindo. Esse tipo de manifestação é mais comum em idosos e frequentemente não se chega a uma causa específica. Situações desse tipo, entretanto, são tratadas com medicamentos apropriados que visam à diminuição das ocorrências nos pacientes.
Não se trata de uma situação simples. Afinal, se o atleta costuma estar cercado de outras pessoas no momento em que sente a cãibra, os idosos no período noturno geralmente estão sozinhos e podem encontrar dificuldades para pedir ajuda, especialmente se a dor e o desconforto gerados pela situação forem muito intensos.
Apesar de geralmente ser um ato instintivo de quem está sofrendo com a dor, no momento em que se percebe a cãibra, o correto é procurar estender o grupo muscular. Quando ocorre na panturrilha, por exemplo, deve-se empurrar o pé para cima por alguns segundos, até que o desconforto diminua.
Em diversas situações, a pessoa precisará de ajuda para estender os músculos afetados, tamanha é a dor gerada pela cãibra. Vale destacar também, especialmente nestes meses de inverno, que é recomendável evitar a exposição ao frio logo após a ocorrência da cãibra ou até mesmo se você costuma ter episódios deste tipo.
É preciso ressaltar também que, apesar do que indica a “sabedoria popular”, o simples fato de comer bananas não impede a ocorrência de cãibras. Ajuda a evitar, é claro, mas não será o suficiente para que uma pessoa não venha a sofrer com este desconforto caso outros pontos não sejam observados.
“Quem tem muitas cãibras deve procurar seu médico para identificar as causas corrigíveis [diuréticos, estatinas, doenças endocrinológicas, indivíduos que retiraram o sal totalmente da dieta, exercícios sem hidratação balanceada, etc.]. Se não se descobre a causa, há tratamentos específicos. Água tônica à noite pode ser útil devido ao quinino, [bem como outras] drogas mais específicas, que devem ser orientadas pelos profissionais médicos”, completa Gattaz.
Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo