Câncer colorretal: pessoas mais jovens precisam entender e se prevenir

22 de agosto - 2017
Por: Equipe Coração & Vida

Quando se trata de câncer colorretal, as pessoas de meia-idade, hoje, parecem ter muito em comum com as pessoas nascidas em 1890. Foi isso o que concluiu um estudo publicado recentemente no Journal of the National Cancer Institute, que veicula pesquisas e descobertas realizadas na Universidade de Oxford, na Inglaterra.

Para sermos precisos: o risco relacionado com a idade de uma pessoa para o desenvolvimento do câncer de cólon e reto diminuiu com relação à primeira metade do século 20; mas a questão dos mais jovens, entre os 30 e 55 anos, é que preocupa os especialistas.

Foto: Shutterstock
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Segundo a pesquisa, as novas gerações “estão de volta ao nível dos nascidos no final do século 19” quando se trata desse tipo de câncer.

A proporção de câncer retal diagnosticado em adultos com idade inferior a 55 anos duplicou em apenas duas décadas. Os estudiosos ingleses, por isso, pediram a ampliação do rastreio da doença no início da vida na conclusão de sua pesquisa.

Mas esse e outros estudos também permitem conhecer melhor as causas e tratamentos eficientes para o câncer colorretal. Sobre isso, o Coração & Vida entrevistou Fernanda Capareli Azevedo, oncologista do Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, para falar desse mal, como lidar com ele e, principalmente, como se prevenir contra a doença.

Coração & Vida: Estudos recentes apontam que os casos de câncer colorretal em pessoas com menos de 55 anos dobraram nas últimas duas décadas. A observação valeria para o Brasil? É um tipo de câncer que vem crescendo por aqui também?

O câncer colorretal corresponde a uma das neoplasias mais incidentes tanto em homens quanto em mulheres. Historicamente, a idade de maior incidência é a partir da sexta década de vida. Mas vem se observando um número cada vez maior de pacientes abaixo dos 50 anos com esse diagnóstico, sim. Dados coletados em um estudo norte-americano com mais de 490 mil indivíduos demonstraram uma incidência duas vezes maior entre os pacientes de 20 a 29 anos (1 caso para cada 100 mil diagnosticados) quando comparado ao início da década de 1980, o que reforça nossa observação cotidiana. No Brasil, não temos dados tão precisos, mas um levantamento realizado pelo A.C. Camargo Cancer Center também levanta preocupação, uma vez que, dos 1.167 pacientes diagnosticados nessa instituição com câncer colorretal de 2008 a 2015, 20% deles tinham menos de 50 anos.

C&V: Quais os sintomas do câncer colorretal? Quando eles são notados, a doença em geral já está avançada?

Não existe nenhum sintoma clássico que sinalize o diagnóstico. A doença pode ser, inclusive, totalmente assintomática, sendo diagnosticada em um exame de rastreio, por exemplo. Geralmente, os sintomas mais frequentemente associados são sangue nas fezes, cólicas intestinais recorrentes, mudanças do hábito intestinal (alternância de períodos de diarreia com períodos de “intestino preso”) e anemia por perdas crônicas de sangue nas fezes sem que o paciente perceba. Em casos mais avançados, o paciente pode evoluir com perda de peso progressiva e inexplicada – e até um quadro de obstrução intestinal (caracterizado por parada total de eliminação de gases e fezes, aumento do volume abdominal, dores abdominais intensas como cólicas e até mesmo vômitos) ou perfuração da parede intestinal. Essas últimas manifestações definem uma apresentação complicada do câncer colorretal, sendo quadros clínicos graves, com risco de vida, que precisam de cirurgia de urgência.

C&V: A partir de que idade costumam ser pedidos exames médicos que apurem a possibilidade de um indivíduo ter câncer colorretal? Com esse aumento de casos, os especialistas estão requisitando exames mais cedo?

A idade de início dos exames de rastreio para esse tipo de câncer nas principais entidades nacionais e internacionais é a partir dos 50 anos para a população em geral. Se um indivíduo tem um parente de primeiro grau que desenvolveu a doença antes dos 50 anos, o recomendado é que a idade de início do rastreio seja 10 anos antes da idade de diagnóstico no paciente. Isso porque a maior parte dos tumores colorretais originam-se de pólipos, que são lesões benignas, mas com potencial de transformarem-se em tumor maligno em 7 a 10 anos em média. O que queremos quando um paciente faz uma colonoscopia de rastreamento é detectar no máximo um pólipo – que, retirado, reduz muito a chance de o indivíduo desenvolver um câncer colorretal.

C&V: A colonoscopia é o exame mais determinante para o problema? É um exame visto por muitas pessoas como incômodo e até com certa vergonha. Isso problematiza a descoberta de casos?

A colonoscopia é o exame mais recomendado porque permite biópsia da lesão para confirmação do diagnóstico. E também permite a detecção e retirada dos pólipos, como explicado antes. O exame de colonoscopia ainda carrega certos preconceitos, principalmente na população mais idosa e menos esclarecida, que acredita que o exame seja extremamente desconfortável. Mas uma colonoscopia bem realizada se faz com paciente sob sedação, o que minimiza muito o desconforto. Daí ser um dever de todo médico, independente da sua área de atuação, desmistificar o exame.

C&V: O estilo de vida (alimentação, por exemplo) influencia no surgimento desse tipo de câncer? A hereditariedade conta muito?

Está mais do que provado que hábitos de vida ditos ocidentalizados, como mais calorias, maior consumo de alimentos processados (como embutidos), maior consumo de gordura animal, menor consumo diário de fibras, verduras e frutas, obesidade, sedentarismo e tabagismo são fatores relacionados ao aumento da incidência de câncer colorretal. A vasta maioria desses tumores são ditos esporádicos, sem nenhum tipo de herança genética identificável. Mas a hereditariedade é um fator de risco. Um indivíduo que tenha um parente de primeiro grau que desenvolveu a doença apresenta duas vezes mais risco de também apresentar a doença.

C&V: E que bons hábitos as pessoas podem adquirir para prevenir a doença?

É importante a redução de ingestão de gordura de origem animal, maior consumo de alimentos naturais como frutas, verduras e oleoginosas (como nozes), preferir proteína animal magra (como peixe), cortar o tabaco, consumir de forma moderada o álcool e manter uma prática regular de atividades físicas. Todos são hábitos que levam a um menor acúmulo de gordura corpórea, impactando não só na redução de alguns tipos de tumores, como no câncer colorretal, mas também na prevenção de problemas cardiovasculares, como infarto agudo do miocárdio e acidentes vasculares cerebrais.

C&V: Quando uma pessoa é diagnosticada, qual o procedimento mais comum? Cirurgia é sempre necessária? Como isso ocorre, em geral?

Cerca de 75% a 80% dos casos de câncer colorretal são diagnosticados com a doença em estádios iniciais, ou seja, restrita ao segmento do intestino sem evidência de doença em órgãos como fígado e pulmão (o que define doença metastática). Para esses pacientes, o único tratamento para a cura é cirúrgico, que pode ser realizado por técnica convencional (cirurgia aberta) ou por laparoscopia (com resultados equivalentes).

C&V: E os tratamentos de quimio e radioterapia, sempre são necessários?

Em algumas situações para o câncer de cólon, quando se estima que há risco de a doença voltar em outros órgãos, pode-se discutir uso de quimioterapia complementar após a cirurgia por três a seis meses como estratégia para aumentar chance de cura. Nos tumores de reto, quando se têm doença de maior volume na pelve, pode-se utilizar radioterapia junto com a quimioterapia antes do procedimento cirúrgico definitivo para facilitar a retirada do tumor, reduzir a chance de o paciente ficar com uma colostomia definitiva e reduzir a chance do retorno da doença no local operado.

C&V: Quando um paciente passa pelo problema, quanto tempo depois de encerrado o tratamento ele ainda precisará fazer acompanhamento do caso?

Após todo o tratamento, o paciente deve passar por uma rotina de consultas, exames laboratoriais e exames de imagem (geralmente tomografias do tórax e abdome completo) por um período de 5 anos. Só após esse período de seguimento consideramos o paciente curado.

C&V: Qual a “taxa de cura” de um câncer colorretal?

Como qualquer outro câncer, a chance de cura está diretamente relacionada ao estágio da doença no diagnóstico. As chances de cura variam de mais de 90% para a doença descoberta em estádio I (o mais precoce possível) para até 5 a 10% para doença diagnosticada metastática (estádio IV). Os avanços em oncologia são contínuos e vêm melhorando muito os resultados. Técnicas cirúrgicas mais modernas, esquemas de quimioterapia e radioterapia mais eficazes, emprego de drogas biológicas e até mesmo imunoterapia para casos estritamente selecionados fazem com que atinjamos chances de cura em torno de 60% na população de câncer colorretal como um todo. Muito ainda tem que ser feito, mas estamos no caminho certo.

Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo

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