Crianças à mesa: os desafios dos pais nas refeições
Quem tem filhos certamente já teve de enfrentar esta cena: sentada à mesa, a criança se recusa a comer determinado alimento. E não há o que lhe faça mudar. A mãe insiste, o pai insiste, mas nem sinal de que a criança irá ceder. Em cenários assim, afinal, o que fazer?
De acordo com a nutricionista Paula Mintz Hertel, é preciso ter cuidado em situações deste tipo. Isso porque, ainda que seja natural insistir para que a criança prove diferentes alimentos e coma de maneira saudável, forçar os filhos pode simplesmente gerar problemas com consequências para a vida toda.
“Os pais não devem forçar, pois isso pode gerar um ‘trauma’. Em outro momento, o alimento deve ser oferecido novamente de diversas formas [ex: abobrinha refogada, assada, grelhada, lasanha de abobrinha, abobrinha com carne moída, abobrinha ralada]”, explica a especialista.
É o que pretende fazer a geofísica Soraia Mendes. Prestes a dar à luz Gabriel, seu primeiro filho, ela pretende oferecer alimentos saudáveis à criança em diferentes situações, com “formatos e preparos” diversos, para evitar a simples rejeição de alimentos importantes ao desenvolvimento infantil.
“Há várias formas de oferecer um alimento à criança. Se ela não come legumes crus, por exemplo, é possível oferece-los cozidos. Há algumas metodologias para incentivar a criança a comer, como fazer um prato bonito, que seja instigante para a criança. Formar um desenho no prato, por exemplo. Além disso, quando a criança é um pouco maior, é possível fazer com que ela participe do preparo da comida, para que ela comece a se interessar mais por alimentos diferentes, a provar outras comidas”, afirma Soraia.
A opinião da geofísica é referendada pela nutricionista Sabine Nunes Boilesen, do Hospital Sírio-Libanês. De acordo com ela, a orientação aos pais é que os novos alimentos sejam oferecidos entre 8 e 10 vezes para a criança.
“Após essa exposição, acredita-se que já é possível determinar se este alimento fará parte de seu hábito alimentar”, explica.
Hertel chama a atenção também para o fato de que o paladar da criança não tem início somente a partir do nascimento. Segundo estudos, o bebê começa a desenvolvê-lo ainda dentro do útero da mãe, em torno da 14ª semana de gestação. Por isso, de acordo com ela, é muito importante promover uma alimentação equilibrada desde o início da gravidez. Sem descuidar, é claro, após o nascimento.
“Os hábitos alimentares da família, o exemplo dentro de casa, também determinam o paladar da criança. O contato com os alimentos mais naturais desde a infância é fundamental, pois muitos alimentos industrializados contêm realçadores de sabor [ex: glutamato monossódico], o que pode fazer com que as crianças percam interesse por alimentos in natura, por exemplo. Quanto maior a variedade de alimentos in natura for oferecida para a criança na primeira infância, melhor”, explica a nutricionista.
Adepta de uma alimentação mais saudável e balanceada desde o início da gravidez, Soraia reforça que pretende seguir com esta rotina alimentar após o nascimento, de modo a incentivar a criança a ampliar seu paladar.
“Faz parte da educação da criança tentar formar um paladar variado, para que ela experimente de tudo. É claro, ela não irá gostar de tudo. A gente não gosta de tudo. Mas que ela experimente, pelo menos conheça os alimentos”, afirma a geofísica, salientando também a ideia de que as crianças devem observar o exemplo nos próprios pais.
“Não adianta você ter um armário cheio de pacotes de bolachas e uma fruteira vazia. É preciso incentivar a criança e oferecer a ela os produtos mais naturais”, completa.
Boilesen compartilha a opinião e ressalta que é muito difícil impedir completamente que a criança consuma alimentos industrializados.
“Acredito que a palavra mais correta a utilizar seria ‘evitar’, principalmente quando falamos em educação alimentar, visto que chegará um momento da vida da criança em que ela irá frequentar festas de aniversário de amigos e esses alimentos estarão presentes”, afirma a nutricionista.
Ainda assim, é preciso muita atenção aos alimentos oferecidos à criança na chamada primeira infância. Justamente por ser um período de formação de hábitos, más escolhas nesta fase poderão resultar em problemas futuros. Um futuro não tão distante, entretanto.
“A alimentação inadequada pode contribuir para o desenvolvimento de diversas doenças crônicas como dislipidemia, diabetes e hipertensão, por exemplo”, finaliza a nutricionista.
Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo