Discussão humanizada
Thassio Borges
O assunto é polêmico e rende inúmeras discussões. Por isso, uma decisão da mais alta corte de direitos humanos da Europa ajudou a jogar luz sobre a questão, de interesse no meio médico. No início de junho, a Corte Europeia de Direitos Humanos ratificou a determinação da Justiça francesa que permitia a interrupção de um procedimento que mantinha um homem vivo há sete anos.
O enfermeiro sofreu um acidente de moto há sete anos que o deixou tetraplégico. Aos 38 anos, o francês vive em estado vegetativo. Não fala, não se mexe, recebe alimentação por sonda e não tem consciência, segundo os laudos médicos apresentados na ação pelo hospital francês onde está internado.
Com isso, tanto os médicos quanto a mulher de Lambert entraram na Justiça para garantir a suspensão da alimentação por sondas, permitindo que o francês tenha uma morte digna. Os pais dele, no entanto, eram contrários à ideia e apelaram à Corte Europeia dos Direitos Humanos. Para justificar sua decisão, a Corte afirmou que se trata da suspensão de um tratamento médico fútil.
A polêmica é evidente porque na maioria dos países tanto a eutanásia passiva quanto o suicídio assistido são proibidos em qualquer situação.
De acordo com Artur Katz, coordenador da Oncologia Clínica do Centro de Oncologia do Hospital Sírio-Libanês, a discussão não é nova, mas o debate poderia ser incentivado ao menos no meio médico.
“A discussão dentro da sociedade médica seria salutar para tentar trazer mais informação, um maior debate sobre o tema. Até mesmo para pessoas que têm interesse no assunto”, afirma o oncologista.
O cardiologista Max Grinberg, coordenador do Espaço Proética do InCor (Instituto do Coração), concorda com Artur Katz e diz desconhecer qualquer discussão atual no Brasil com o objetivo de legalizar algumas dessas práticas, ainda que em determinadas situações.
“O assunto merece reflexão, pois interessa a muitas pessoas. Quem não está vivendo aquela situação pode enxergar de uma maneira por diversos motivos, mas quem está sentindo aquilo, vivenciando, tem o direito de pensar dessa maneira e discutir o assunto”, avalia o cardiologista.
Grinberg explica ainda as diferenças entre a eutanásia passiva e a ativa. De acordo com ele, esta ocorre quando é o próprio paciente que a exerce, enquanto a passiva se caracteriza quando é um terceiro que a pratica.
“O suicídio assistido é a eutanásia ativa”, explica. O cardiologista salienta, no entanto, que mesmo nos países em que o suicídio assistido é permitido, é necessário atender a uma série de critérios para que a decisão seja colocada em prática.
“O paciente tem que preencher os requisitos [para obter a autorização]. Não é para qualquer situação. Uma vez concedida essa permissão, a pessoa fica com aquilo à disposição. Muitos que chegam nessa fase, quando sentem que sua doença é irreversível e não querem enfrentar mais sofrimento, sentem-se mais confortáveis em ter o domínio da situação. Em saber que, a qualquer momento, se a situação piorar, pode-se decidir por terminar o sofrimento”, explica.
O oncologista Artur Katz explica ainda que, atualmente, o que existe no Brasil e em diversos países são equipes multidisciplinares que atuam no objetivo de atenuar a dor e o sofrimento, não apenas do paciente, mas também dos familiares que o acompanham durante o processo.
“É importante procurar atenuar a dor em geral. Para isso, existem essas equipes multidisciplinares. Esses profissionais, no entanto, não são ‘utilizados’ somente em casos terminais. Centros oncológicos de todo o mundo incorporam essas equipes para atenuar efeitos colaterais durante o tratamento, como dor crônica, falta de apetite, falta de ar, entre outros sintomas”, avalia. “Isso, no entanto, passa longe do suicídio assistido, que nem é discutido no Brasil por ser algo ilegal”, finaliza o oncologista.
Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo