Estudo brasileiro liga definitivamente as queimadas à morte celular e câncer

02 de março - 2018
Por: Equipe Coração & Vida

Desde as carteiras escolares nós aprendemos que fazer queimadas na mata sem controle, como tanto acontece em diversos pontos rurais do Brasil, pode causar sérios prejuízos à fauna e à flora. Mais: esse modo de desmatamento reduz a cobertura vegetal e, junto, a fertilidade do solo – a partir daí, comprometendo a qualidade do ar e a saúde humana. Foi nessa última questão que se concentrou um estudo brasileiro. E o alerta é grave.

Publicada em meados de 2017 na revista Nature (Scientific Reports), a pesquisa mostrou, com detalhamento inédito, o mal que a fumaça produzida pelas queimadas na floresta amazônica causa à saúde de milhões de pessoas. Acontece que os efeitos de uma ação desse tipo, como se sabe hoje, podem se estender por boa parte da América do Sul.

Foto: Shutterstock
Foto: Shutterstock

O trabalho trata especialmente dos graves danos ao material genético e morte celular no pulmão humano – e foi realizado em uma colaboração de pesquisadores da Universidade de São Paulo, Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Morte celular

Esta é a primeira vez que uma pesquisa científica conseguiu demonstrar que as partículas provenientes das queimadas na Amazônia, ao entrar nos pulmões, causam e aumentam inflamações, o estresse oxidativo e danos genéticos nas células.

O impacto no DNA dos indivíduos pode ser tão importante, ao longo do tempo, que a célula pulmonar perde a capacidade de sobreviver e morre, como explicou a pesquisadora Nilmara de Oliveira Alves, autora principal do estudo.

“Ou esta célula perde o controle celular e começa a se reproduzir desordenadamente, evoluindo para câncer de pulmão”, completou.

Para entender os processos que ocorrem com a queimada e como isso impacta as pessoas, células de pulmão humano foram expostas a partículas coletadas na Amazônia e analisadas com técnicas bioquímicas avançadas, medindo-se o grau de inflamação e de dano no DNA.

O estudo descobriu os mecanismos de morte celular e identificou um dos compostos responsáveis por isso. Analisando quimicamente, o composto reteno tem um forte efeito na morte celular de células do pulmão. Nos experimentos, após 72 horas de exposição às partículas, mais de 30% das células em cultura já estavam mortas.

Um problema mundial

A Amazônia sofre com o desmatamento e queimadas há décadas – uma das consequências de um processo de ocupação desordenado segundo avaliou o pesquisador Paulo Artaxo, do Instituto de Física da USP, coautor do estudo.

Todo ano, especialmente em setembro e outubro, os focos de incêndios se multiplicam e nuvens de fumaça cobrem uma imensa parte da região amazônica.

Estudos anteriores coordenados pela pesquisadora Sandra Hacon, da Fiocruz, também coautora da pesquisa em conjunto, já haviam mostrado a ocorrência, por causa disso, de doenças respiratórias na população local.

Para recolher os dados, a pesquisadora analisou registros do Sistema Único de Saúde e sobre concentração de poluentes e observou uma forte associação entre as queimadas e os efeitos na saúde – mas até então não se conheciam os mecanismos que levavam aos danos no pulmão.

Como a própria introdução do artigo publicado na revista Nature alerta, hoje, a maioria dos estudos sobre a poluição do ar concentra-se em emissões de combustíveis fósseis em centros urbanos.

“No entanto, aproximadamente metade da população mundial está exposta à poluição do ar causada por emissões de queima de biomassa”, apontou a pesquisa.

Na população da Amazônia brasileira, são mais de 10 milhões de pessoas diretamente expostas aos poluentes resultantes do desmatamento e incêndios agrícolas. No mundo, a pesquisa calcula que 3 bilhões de seres humanos são impactos pelas queimadas.

Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo

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