Insônia pode (e deve) ser tratada
Em seu estado crônico, a insônia atinge em torno de 10% a 15% dos brasileiros. Quase metade da população (cerca de 45%), no entanto, relata problemas relacionados ao sono no país, ainda que a condição não seja duradoura. Os dados provêm do Projeto EPISONO, desenvolvido pelo Instituto do Sono em 2015 e 2016.
A alta incidência da insônia no Brasil fez com que o problema chegasse a diferentes grupos, atingindo homens, mulheres, idosos, adolescentes e até mesmo crianças. As causas, especialmente devido à amplitude do transtorno, variam muito entre seus portadores.
De acordo com Márcia Pradella-Hallinan, neurologista e especialista em Medicina do Sono do Hospital Sírio-Libanês, até mesmo a definição da insônia apresenta variações, podendo ser considerada tanto uma queixa como um sintoma de outro problema no indivíduo.
“Ou seja, queixa de dificuldade em iniciar ou manter [o sono], dormir pouco, acordar cedo demais, acordar com a sensação de que o sono não foi suficiente ou satisfatório, ou ter dificuldades no desempenho, concentração ou memória em decorrência de dormir mal. Essa queixa também pode estar associada a diversas patologias clínicas e/ou psiquiátricas e, nesse caso, é considerada como sintoma associado à patologia de base”, explica a neurologista.
Diferenciar o transtorno de sua modalidade transitória é um dos primeiros passos para definir como a insônia deve ser abordada e tratada pelo corpo médico.
De acordo com Márcia, a insônia transitória é bastante comum e costuma durar de um a dois dias. “Em geral, o causador é de fácil identificação. Normalmente são questões pessoais, inquietações e preocupações”, completa.
Quando esta dificuldade com o sono se prolonga para além desse período, o indivíduo costuma presenciar sintomas mais sérios, tornado aconselhável uma avaliação médica. Nas consultas, o profissional especializado buscará identificar e avaliar as causas para a insônia. Para isso, eventualmente irá solicitar exames específicos para confirmar o diagnóstico do transtorno.
“As queixas mais comuns dos pacientes com insônia são de fadiga, dores musculares, dor de cabeça, humor irritadiço, falta de concentração e falta de vontade para realizar qualquer atividade que não seja a obrigatória, como trabalhar e cuidar dos filhos, por exemplo”, explica a especialista, referindo-se a condições que invariavelmente trazem sérios prejuízos às pessoas.
“Esses sintomas podem trazer consequências sérias no trabalho, relacionamento com familiares, amigos e cônjuges. Estudos científicos já mostraram que, na insônia de longa duração, existe uma ativação fisiológica crônica do sistema de alerta do organismo, inclusive com taxas aumentadas de produção do hormônio cortisol”, completa.
Causas da insônia
Mas, afinal, quais são as causas para a insônia? Segundo Márcia, o transtorno pode ser gerado tanto a partir de uma causa física, psicológica ou até mesmo de ambas.
“O estilo de vida associado ao estresse, desemprego e acontecimentos inesperados, como a morte de um parente ou um acidente [por exemplo], são fatores que aumentam o risco para insônia. Porém, outros fatores podem favorecer o início desta condição, como uma doença clínica ou psiquiátrica, uso abusivo de certos medicamentos e consumo de álcool”, avalia.
Ainda assim, conforme explica a médica, as mulheres têm maior risco de desenvolver insônia, especialmente durante a gestação e após a menopausa. Idosos, de ambos os sexos, também apresentam alto índice de prevalência do transtorno. A insônia também pode aparecer em crianças e adolescentes, com a diferença de que, nestes períodos, a abordagem do problema é essencial para que o transtorno não evolua na fase adulta.
“A insônia da criança tem principalmente características comportamentais, e ocorre com mais frequência nos lactentes e até os três anos de idade. A orientação de como ensinar a criança a dormir sozinha e apreciar o sono é fundamental para se evitar [a ocorrência do transtorno]. No adolescente, ocorre um atraso do relógio biológico que predispõe ao sono de uma até duas horas. Ou seja, se o sono ocorria em torno da 22h, com facilidade o adolescente pode ter sono apenas as 23h ou 24h.”
Mas há medidas simples para agregar qualidade ao sono. “Reduzir a iluminação no ambiente, ficar longe de qualquer tipo de monitor [celular, PC, TV] 30 minutos antes do horário de dormir enquanto faz uma atividade relaxante, como leitura, por exemplo, e receber sol pela manhã são bastante eficazes na regularização do sono, e um treinamento para uma boa qualidade de sono para a vida toda”, afirma.
O tratamento da insônia, graças à sua variedade de causas, também é diversificado. Ele envolve orientação médica quanto ao estilo de vida da pessoa, ao manejo do estresse e à atividade física, e quanto ao uso de um trabalho mental, como yoga e pilates, técnicas de meditação, acupuntura, fisio-hidroterapia e fitoterapia.
Além disso, em alguns casos, são administradas medicações sintéticas, cuja finalidade é quebrar o ciclo de noites mal dormidas. As opções existem aos montes, o que não se deve é simplesmente aceitar a insônia como algo natural, evitando assim o aconselhamento médico.
Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo