Tire suas dúvidas sobre transtorno do déficit de atenção e hiperatividade

27 de junho - 2016
Por: Equipe Coração & Vida

O alerta é mundial: o número de crianças e adolescentes diagnosticados com Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) vem crescendo em ritmo acelerado. Um estudo realizado entre 2011 e 2012 pelo Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC, em inglês), a agência de saúde pública dos Estados Unidos, revelou que 11% das crianças americanas entre 4 e 17 anos receberam o diagnóstico de TDAH.

Os números superam a média global, considerando que o distúrbio comportamental, que se caracteriza por sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade, afeta de 3% a 7% das crianças em idade escolar em todo o mundo. Por aqui, os dados não causam menos espanto: depois dos Estados Unidos, o Brasil é o maior consumidor de metilfenidato, a droga mais indicada no tratamento.

Foto: Shutterstock
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Uma recente pesquisa feita em Taiwan mostrou que as crianças mais jovens em uma sala de aula são mais propensas a receber o diagnóstico de TDAH em comparação com as mais velhas. O estudo conclui que os especialistas deveriam levar em conta a imaturidade dessas crianças – que, em alguns casos, seriam medicadas sem necessidade.

Uma explicação para o aumento progressivo do número de pacientes diagnosticados está relacionada à maior conscientização sobre a doença. Por outro lado, acende uma questão polêmica: o uso indevido dos medicamentos.

Para falar sobre TDAH, convidamos o Dr. Francisco Frederico Neto, pediatra e coordenador do Ambulatório de Distúrbios de Aprendizagem da Filantropia do Hospital Sírio-Libanês, que esclarece as principais dúvidas sobre a origem, os sintomas e o tratamento dessa patologia.

Causas e sintomas: meu filho tem o transtorno?

O TDAH é um distúrbio multifatorial com forte componente neurobiológico que se manifesta na infância, podendo acompanhar o indivíduo na idade adulta. Estudos indicam que os portadores da doença têm um desequilíbrio na ação dos neurotransmissores – dopamina e noradrenalina.

Quando existe a predisposição genética para TDAH, o indivíduo poderá ou não apresentar os sintomas. Se houver sintomas, poderá ser em diferentes graus de intensidade. Acredita-se ainda que a probabilidade do transtorno se manifestar tenha relação com os estímulos ambientais – estrutura e rotinas familiares, tipo de escola, entre outros.

Embora haja uma vertente médica que rejeita essa teoria, e questiona até a existência do TDAH, trata-se de uma doença reconhecida pela Organização Mundial da Saúde e que apresenta três sintomas clássicos: desatenção, hiperatividade e impulsividade.

“A criança pode apresentar todos ou somente um desses sintomas. Nas meninas, predomina o déficit de atenção; nos meninos, prevalece a inquietação psicomotora, a hiperatividade. Em ambos, pode existir a impulsividade”, explica Dr. Francisco.

Crianças hiperativas não ficam sentadas ou em silêncio por muito tempo, são agitadas, balançam mãos e pernas. Aquelas que manifestam com mais ênfase o déficit de atenção costumam não concluir as tarefas, distraem-se com qualquer estímulo, perdem ou esquecem objetos, são dispersas, desorganizadas, parecem não escutar e sofrem com as atividades que exigem concentração, como a leitura.

A impulsividade, por sua vez, faz com que a criança seja impaciente e imediatista, não espera sua vez para falar, interrompendo ou respondendo perguntas precipitadamente.

“Em cada indivíduo, esses sintomas manifestam-se com maior ou menor intensidade. É preciso critério para avaliar se, de fato, trazem prejuízos ao desenvolvimento e à sociabilidade da criança, tanto na escola como em família”, reforça.

Por outro lado, quanto mais tardio o diagnóstico, maior o prejuízo, aumentando as chances de baixo desempenho escolar, repetência, suspensões, baixa autoestima e até mesmo a experimentação de drogas.

A construção do diagnóstico

O diagnóstico do TDAH é clínico, baseado na investigação criteriosa do estilo de vida do paciente, seu histórico de saúde, a psicodinâmica familiar, o ambiente escolar, entre outros aspectos. O ideal é que o diagnóstico seja fechado por uma equipe multidisciplinar, que pode incluir pediatra, neurologista, neuropsicólogo, psiquiatra infantil, fonoaudiólogo e psicopedagogo.

“O trabalho em conjunto garante um diagnóstico mais preciso e seguro, afastando distúrbios e outras condições cujos sintomas se assemelham aos do TDAH”, ressalta o médico.

Nessa lista, podemos citar os problemas visuais, auditivos, ansiedade, depressão e os transtornos de aprendizagem, como a dislexia. Sem falar nos casos que parecem TDAH e não passam de imaturidade ou inquietação provocadas por outras razões, como o excesso de exposição a jogos eletrônicos e sedentarismo.

A abordagem multidisciplinar também ajuda a identificar questões de ordem emocional, de grande importância, mas que não definem a patologia. Problemas familiares, como divórcio dos pais, perda de um ente querido ou outro episódio traumático podem causar mudanças no comportamento. A criança pode ficar desconcentrada e distraída por um período, mas não se trata de déficit de atenção.

Outra ferramenta usada na construção do diagnóstico correto é a aplicação de questionários, respondidos tanto pelos pais quanto pelos educadores. De padrão internacional, esse material lista uma série de perguntas para investigar os principais sintomas de desatenção, hiperatividade e impulsividade. Não basta, porém, que os sintomas sejam identificados. É preciso considerar com que frequência, intensidade, e em quais circunstancias ocorrem.

“Se as queixas se concentram num local específico, como a escola, e em casa a criança tem uma conduta normal, provavelmente não será um caso de TDAH, pois os sintomas devem se manifestar nos diferentes ambientes”, explica o Dr. Francisco.

Da mesma forma, nem todas as crianças dispersas, ou mais ativas e inquietas, são portadoras do distúrbio. “A presença de um ou mais sintomas não caracteriza, necessariamente, o quadro de déficit de atenção e hiperatividade. Por isso, a importância da avaliação clínica ser feita por profissionais que tenham familiaridade com a doença”, reforça.

A dificuldade de aprendizagem tem se tornado uma queixa cada vez mais comum em consultórios. Mais uma vez, é preciso cautela ao se associar sinais de desatenção e fraco desempenho escolar. “Em boa parte das vezes o problema não é de saúde, e sim pedagógico ou ambiental. Nesses casos, remédios jamais devem ser prescritos.”

Por fim, é preciso, ainda, considerar a idade do paciente. Por segurança, o diagnóstico costuma ser feito só a partir dos 7 anos. Antes disso, as chances de fechar um diagnóstico equivocado são grandes.

“As crianças de hoje são hiperestimuladas com jogos eletrônicos, escola em tempo integral, excesso de compromissos. É natural que sejam mais agitadas, inquietas, distraídas. Vale mais acompanhar o paciente, orientando atividades físicas, socioeducativas e controle no tempo de uso de eletrônicos”, afirma.  Só em casos muito específicos poderá haver a recomendação de medicação em crianças menores.

Abordagem terapêutica

Os sintomas do TDAH são controlados com psicoestimulantes, sendo o metilfenidato (Ritalina é o nome comercial) uma droga comprovadamente eficaz e a mais usada. O medicamento promove um ajuste dos níveis de neurotransmissores – e os efeitos benéficos são notados em poucas semanas. Há outras opções de medicação, caso a criança não se adapte.

Em geral, o tratamento dura de seis meses a dois anos. “Se os sintomas estiverem bem controlados, podemos suspender o uso dos remédios e manter o acompanhamento multidisciplinar do paciente”, explica o pediatra, que também recomenda, em alguns casos, a psicoterapia cognitivo-comportamental como reforço ao tratamento.

O importante é aliviar ao máximo o sofrimento dessas crianças, que não raro apresentam problemas de autoestima e convívio social, pois se sentem fracassadas em relação aos colegas de classe. Fora do consultório, os pais têm papel fundamental nessa batalha.

“As crianças precisam ser estimuladas com jogos, brincadeiras ao ar livre, música, esportes, atividades de lazer. Quanto maior for o apoio familiar, melhores serão as respostas ao tratamento”, conclui.

Revisão técnica
Prof. Dr. Max Grinberg
Núcleo de Bioética do Instituto do Coração do HCFMUSP
Autor do blog Bioamigo

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